quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

-Aboio de Saudade -
(uma homenagem ao meu pai, Pedro Inácio)

Quando escuta um aboio
As pernas ficam tremendo
Carecendo de apoio
Para não sair correndo
Pensando que ainda é novo
Fica sem jeito e choroso
com a saudade doendo

Bom vaqueiro que se preza
Não lamenta o seu passado
Vive a contar sem pressa
Como conduzia o gado
Aboiava em poesia
E o gado entendia
Seu aboio apaixonado

Espichado numa rede
Na latada do oitão
Quando olha pra parede
arrebenta o coração
Quando vê saindo dela
As imagens de uma tela
De cinema do sertão

Seu cavalo companheiro
Zabumbava com as patas
O aboio do vaqueiro
Embrenhado pelas matas
Espantando a solidão
Machucando o coração
Das donzelas apaixonadas

Não podendo esquecer
Seu amigo mais fiel
Lembrando de agradecer
Quando chegar lá no céu
Do que fez aqui na terra
Descendo e subindo serra
Seu cachorro tafarel

Um bezerro desmamado
Que virava barbatão
Brigava dentro do mato
E não ia pro mourão
Mas um vaqueiro afamado
Leva o bicho amarrado
À presença do Patrão

A vaca velha malhada
Já cansada de dar cria
Com as pontas aneladas
Lá no cercado mugia
Estava sentindo dor
E o vaqueiro doutor
Ia lá e acudia

Lá num gancho de madeira
Já repousa o seu gibão
As esporas e perneiras
Guarda peito e cinturão
Esperando o seu dono
Que hoje vive em sonho
Seu passado de mourão

Sua pele escurecida
Encardida pelo sol
A velha estrada esquecida
Já coberta de cipó
Esperando uma boiada
E o som da chocalhada
Para não viver tão só

Quando vai escurecendo
Já cansado adormece
De tanto viver correndo
Sua alma já padece
Mas um sorriso dizia
Amanhã é outro dia
E a vida nele aparece

Mas um dia o bom vaqueiro
Sem avisar a ninguém
Bateu em retirada
Foi embora pro além
Deixando em desespero
A família do vaqueiro
Querendo morrer também.

Delzin de Pedro Inácio

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Lembranças da Seca

A seca me lembra a labuta
Do valente homem do sertão
Que amansa a terra bruta
Com a enxada, a foice e o facão

Ele arranca do torrão seco
O pão suado de cada dia
Vira bicho, mas é homem do eito
É um pai de família.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Nem o pé, nem a serra...

O pé de serra que encantou o Rei do Baião, fazendo-o cantar aos quatro mundos, a beleza e as paixões de um povo, não é mais o mesmo. Imaginem a serra, imponente e bela nos tempos de juventude de Gonzagão, hoje ferida de morte, com chamboques que se avistam de longe, mas que de perto, são grandes ferimentos, provocados pelo gume afiado da foice e do machado. Com seus encantos, a serra continua misteriosamente encantada, e o homem, talvez com medo de se encantar por ela, prefere destruí-la a cantá-la, como fez o véi Luiz.
O pé de serra que cantou o véi luiz, não é mais a mesma serra, só ficou lá, a raiz.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Tropa de burros

Tropa de burros

Na curva da estrada
Uma mula apressada
Aponta no estouro
Do relho de couro
Guiando uma tropa
De burros cansados
À feira de troca
Com fardos pesados

O sopro ofegante
De um burro caído
Revela o semblante
De quem foi vencido
O queixo estirado
As patas dobradas
Um olho vazado
Pelas chicotadas

Não tem mais o pelo
No lombo ferido
Já pede arrego
Mas não é ouvido
O relho malvado
Estala de novo
Ferindo o coitado
Bem no cabelouro

Levanta aos tropeços
Batendo os cascos
Morrendo de medo
Dos relhos carrascos
As pernas tremendo
Joelho pelado
Das quedas no tempo
Do ofício malvado

Já velho e cansado
Porém orgulhoso
Esconde o cansaço
E ergue o pescoço
Apruma a carga
No lombo pisado
Faz força e larga
De dente trincado

Estrada comprida
E o sol a tremer
A tropa faz fila
Cumprindo o dever
Espera o comando
Que vem do chicote
E saem marchando
Num passo de trote

O velho tropeiro
De cara encardida
Acende o isqueiro
Dar uma cuspida
Bafora o cigarro
Apruma o chapéu
E faz um pigarro
Olhando pro céu.

Chico Braúna